A sociologia da educação de pierre bourdieu

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A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO DE PIERRE BOURDIEU: LIMITES E CONTRIBUIÇÕES CLÁUDIO MARQUES MARTINS NOGUEIRA * MARIA ALICE NOGUEIRA ** RESUMO: O artigo destaca as contribuições e aponta alguns limites da Sociologia da Educação de Pierre Bourdieu. Na primeira parte, são analisadas as reflexões do autor sobre a relação entre herança familiar (sobretudo, cultural) são discutidas suas t e legitimação das desigualdades so Palavras-chave: Socio opu d to view nut*ge Na segunda parte, cola na reprodução dieu.

Família. Escola. PIERRE BOURDIEU’S SOCIOLOGY OF EDUCATION: LIMITS AND CONTRIBUTIONS ABSTRACT: This paper emphasizes the limits and contributions of Pierre Bourdieu’s Sociology of Education. In the first part, it discusses Bourdieu’s reflections on the relationship between family inheritance (specially the cultural one) and school performance. In the second part, Bourdieu’s theses about the role of school in the reproduction and legitimation of social inequalities are analized.

Key-words: Sociology of Education. Bourdieu. Family. School. apaixonadas que pouco contribuem para uma efetiva compreensão da obra do autor. Bourdieu teve o mérito de formular, a partir dos anos 60, uma esposta original, abrangente e bem fundamentada, teórica e empiricamente, para o problema das desigualdades escolares. Essa resposta tornou-se um marco na história, não apenas da Sociologia da Educação, mas do pensamento e da prática educacional em todo o mundo. Até meados do século XX. redominava nas Ciências Sociais e mesmo senso-comum uma extremamente otimista, de inspiração funcionalista, que atribuía à escolarização um papel central no duplo processo de superação do atraso econômico, do autoritarismo e dos privilégios adscritos, associados às sociedades tradicionais, e de construção e uma nova sociedade, justa (meritocrática), moderna (centrada na razao e nos conhecmentos científicos) e democrática (fundamentada autonomia individual).

Supunha-se que por meio da escola pública e gratuita seria resolvido o problema do acesso à educação e, assim, garantida, em princípio, a igualdade de oportunidades entre todos cidadãos. Os indivíduos competiriam dentro do sistema de condições iguais, e aqueles que se destacassem por seus dons individuais seriam levados, por uma questão de justiça, a avançar em suas carreiras escolares e, posteriormen s posições superiores na PAGF 3′ einterpretação radical do papel dos sistemas de ensino na sociedade.

Abandona-se o otimismo das décadas anteriores em favor de uma postura bem mais pessimista. pelo menos dois movimentos principais parecem estar associados a essa transformação do olhar sobre a educação. Em primeiro lugar, tem-se, a partir do final dos anos 50, a divulgação de uma série de grandes pesquisas quantitativas patrocinadas pelos governos inglês, americano e francês (Aritmética Política inglesa, Relatório Coleman — EUA, Estudos do INED — França) que, em resumo, mostraram, de forma clara, o peso da origem social sobre os destinos escolares.

Embora os resultados dessas pesquisas não tenham conduzido imediatamente à rejeição da perspectiva funcionalista – visto 16 Educação & Sociedade, ano m II, no 78, Abril/2002 que foram interpretados como indicadores de deficiências passageiras do sistema de ensino que poderiam ser superadas com maiores investimentos — contribuíram para minar, a médio prazo, a confiança na tão propalada igualdade de oportunidades diante da escola. A partir deles, tornou-se imperativo reconhecer que o desempenho escolar não dependia, tao simplesmente, dos dons individuais, mas da origem social dos alunos (classe, etnia, s oradia, entre outros). rtificados escolares no mercado de trabalho. Os anos 60 marcam a chegada ao ensino secundário e à universidade da primeira geração beneficiada pela forte expansão do sistema educaclonal no pósguerra. Essa geração, arregimentada em setores mais amplos do que os das tradicionais elites escolarizadas, vê – em parte, pela desvalorização dos t[tulos escolares que acompanhou a massificação do ensino frustradas suas expectativas de mobilidade social através da escola.

A decepção dessa “geração enganada”, como diz Bourdieu, alimentou uma crítica feroz ao sistema educacional e contribuiu para a eclosão do mplo movimento de contestação social de 1968. O que Bourdieu propõe nos anos 60, diante desse acúmulo de “anomalias” do paradigma funcionalista – para usar os termos de Kuhn – é uma verdadeira revolução científica. Bourdieu oferece-nos um novo modo de interpretação da escola e da educação que, pelo menos num primeiro momento, pareceu ser capaz de explicar tudo o que a perspectiva anterior não conseguia.

Os dados que apontam a forte relação entre desempenho escolar e origem social e que, em última instância, negavam o paradigma funcionalista, transformam-se nos elementos de sustentação da nova teoria. A frustração dos jovens das camadas médias e populares diante das falsas promessas do sistema de ensino converte-se em uma transformadora e democratizadora das sociedades e passa a ser vista como uma das principais instituições por meio da qual se mantêm e se legitimam os privilégos soclais.

Trata-se, portanto, de uma inversão total de perspectiva. Bourdieu oferece um novo quadro teórico para a Educação & Sociedade, ano XXIII, no 78, Abril/2002 17 análise da educação, dentro do qual os dados estatísticos acumulados a partir dos anos 50 e a crise de confiança no sistema de ensino vivenciada os anos 60 ganham uma nova interpretação. É impressionante o sucesso alcançado pela Sociologia da Educação de gourdieu.

Passados quase quarenta anos da publicação de Les héritiers – primeira grande obra do autor dedicada à educação -, sua sociologia continua viva e inspirando novos trabalhos sobre os mais diversos aspectos do fenômeno educacional. Ela constitui, ainda hoje, se nao o mais importante, certamente um dos mais importantes paradigmas utilizados na interpretação sociológica da educação. O reconhecimento da força e do alcance da Sociologia da de Bourdieu não pode nos impedir, no entanto, de constatar uas limitações.

Um dos objetivos deste artigo é justamente o de contribuir para uma análise mais equilibrada da obra de gourdieu. O primeiro dos atores segundo sua origem social e familiar e as repercussões dessa formação diferenciada para suas atitudes e comportamentos escolares. Uma das teses centrais da Sociologia da Educação de Bourdieu é a de que os alunos não são indivíduos abstratos que competem em condições relativamente igualitárias na escola, mas atores socialmente constituídos que trazem, em larga medida incorporada, uma bagagem social e cultural diferenciada e mais ou menos rentável no ercado escolar.

O grau variado de sucesso alcançado pelos alunos ao longo de seus percursos escolares não poderia ser explicado por seus dons pessoais – relacionados à sua constituição biológica ou psicológica particular -, mas por sua origem social, que os colocaria em condições mais ou menos favoráveis diante das exigências escolares. A segunda parte do artigo refere-se às teses de Bourdieu sobre a escola e seu papel na reprodução das desigualdades sociais. A escola, na perspectiva dele, não seria uma instituição imparcial que, simplesmente, seleciona os mais talentosos a partir de critérios objetivos.

Bourdieu uestiona frontalmente a neutralidade da escola e do conhecimento escolar, argumentando que o que essa instituição representa e cobra dos alunos são, basicamente, os gostos, as crenças, as posturas e os valores dos grupos dominantes, d nte apresentados como PAGF o papel fundamental de legitimação dessas desigualdades, ao dissimular as bases sociais destas, convertendo-as em diferenças acadêmicas e cognitivas, relacionadas aos méritos e dons individuais.

A herança familiar e suas implicações escolares A especificidade da Sociologia da Educação de Bourdieu e a peculiaridade de sua discussão sobre a questão da herança ultural familiar tornam-se mais claras quando se consideram certas preocupações teóricas mais amplas que caracterizam o conjunto da obra do autor.

A sociologia de Bourdieu como um todo está marcada pela busca de superação de um dilema clássico do pensamento sociológico, aquele que se define pela oposição entre subjetivismo e objetivismo. Por lado, Bourdieu aponta as insuficiências e os riscos das abordagens que se restringem à experiência imediata do ator individual, ou seja, que atêm de modo exclusivo ou preponderante ao universo das representações, preferências, escolhas e ações individuais.

Essas bordagens, rotuladas por ele como subjetivistas, são criticadas não apenas por seu escopo limitado, isto é, pelo fato de não considerarem as objetivas que explicariam o curso da experiência prática subjetiva, mas, sobretudo, por contribuírem para uma concepção ilusória do mundo social que atribuiria aos sujeitos excessiva autonomia e consciencia na condução de suas ações e PAGF 7 preferências, as aptidões, as posturas corporais, a entonação de voz, as aspirações relativas ao futuro profissional, tudo sena socialmente constituído.

Se, por um lado, Bourdieu se afasta, então, do subjetivismo, por utro, ele critica, igualmente, as abordagens estruturalistas, definidas por ele como objetivistas, que descreveriam a experiência subjetiva como diretamente subordinada às relações objetivas (normalmente, de natureza lingüística ou socioeconômica). Segundo ele, faltaria a essas abordagens uma teoria da ação capaz de explicar os mecanismos ou processos de mediação envolvidos na passagem da estrutura social para a açao Educaçao & sociedade, ano XXIII, no 78, Abril/2002 19 individual.

Reconhecer-se-ia as propriedades estruturantes da estrutura sem, no entanto, analisar os processos de estruturação, de operação da strutura no interior das práticas sociais. Como forma de distanciamento em relação ao objetivismo, Bourdieu afirma, então, em primeiro lugar, que a ação das estruturas sociais sobre o comportamento individual se dá preponderantemente de dentro para fora e não o inverso. A partir de sua formação inicial em um ambiente social e familiar que corresponde a uma posição especifica na estrutura social, os indi orariam um conjunto de PAGF 8 OF dentro, sobre o comportamento individual.

Ao contrário, a estrutura social se perpetuaria porque os próprios indivíduos tenderiam a atualizá-la ao agir de acordo com o conjunto e disposições típico da posição estrutural na qual eles foram socializados. Bourdieu observ’a, ainda, e este é um segundo ponto importante em que ele pretende se afastar do objetivismo, que sistema de disposições incorporado pelo sujeito não o conduz em ações de modo mecânico. Essas disposições não seriam normas rígidas e detalhadas de ação, mas princípios de orientação que preclsanam ser adaptados pelo sujeito às variadas circunstâncias de ação. r-se- assim, uma relação dinâmica, não previamente determinada, entre as condições estruturais originais nas quais foi constituído o sistema e disposições do individuo e que tendem a se perpetuar através deste e as condições — normalmente, em parte modificadas – nas quais essas disposições seriam aplicadas. Em poucas palavras, a estrutura conduziria as ações individuais e tenderia a se reproduzir através delas, mas esse processo não seria rígido, direto ou mecânico.

Transpondo essa dlscussão teónca para o campo da Sociologa da Educação, é preciso reconhecer o esforço de Bourdieu para evitar tanto o objetivismo quanto o subetivismo na análise dos fenômenos educacionais. O ator da S ucaçào de Bourdieu não é sujeito individual. Cada ndividuo passa a ser caracterizado por uma bagagem socialmente 20 herdada. Essa bagagem inclui, por um lado, certos componentes objetivos, externos ao indivíduo, e que podem ser postos a serviço do sucesso escolar.

Fazem parte dessa primeira categoria o capital econômico, tomado em termos dos bens e serwços a que ele dá acesso, o capital social, definido como o conjunto de relacionamentos sociais influentes mantidos pela família, além do capital cultural institucionalizado, formado basicamente por títulos escolares. A bagagem transmitida pela familia inclui, por outro lado, certos componentes que passam a azer parte da própria subjetividade do individuo, sobretudo, o capital cultural na sua forma “incorporada”.

Como elementos constitutivos dessa forma de capital merecem destaque a chamada “cultura geral” expressão sintomaticamente vaga; os gostos em matéria de arte, culinária, decoração, vestuário, esportes e etc; o domínio maior ou menor da língua culta; as informações sobre o mundo escolar. Cabe, desde já, obsewar que, do ponto de vista de Bourdieu, o capital cultural constitui (sobretudo, na sua forma incorporadal) elemento da bagagem familiar ue teria o maior impacto na definição

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