Negrinha

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Discutindo o racismo de Monteiro Lobato Não é sobre você que devemos falar por Ana Maria Gonçalves Monteiro Lobato: um homem com um projeto para além do seu tempo – Caçadas de Pedrinho, publicado em 1933, teve origem em A caçada da onça, de 1924.

Portanto, poucas décadas após a abolição da escravatura, que aconteceu sem que houvesse qualquer ação que reabilitasse a figura do negro, que durante séculos havia sido rebaixada para se justificasse moralmente a escravidão, e sem um processo que incorporasse os novos libertos ao tecido da continuaram relegad classe e o preconceit epresentavam o cisc imperfeito” dentro d OF24 S. wp view nent page ex-escravos s de segunda rmalidade.

Eles etina, o “corpo Odo custo, buscava maneiras de encobri-lo, desbotá-lo ou eliminá-lo, contando com a colaboração de médicos, políticos, religiosos e outros homens influentes daquela ápoca. Um desses homens foi o médico Renato Kehl, propagador no Brasil das idéias do sociólogo e psicólogo francês Gustave Le Bon, que defendia a “superioridade racial e correlacionava as raças humanas com as espécies animais, baseando-se em critérios anatômicos como a cor da pele o formato do crânio”, segundo o livro Raça Pura, – Uma história da eugenia no Brasil e no mundo, de Pietra Diwan para a Editora Contexto.

Renato Kehl reuniu ao seu redor uma ampla rede de intelectuais, com quem trocava correspondênci Sv. ‘ipe to View next page correspondência e ideias constantemente, todos adeptos, defensores e propagadores da eugenia, assim definida por ele em 1917: “É a ciência da boa geração. Ela não visa, como parecerá a muitos, unicamente proteger a humanidade do cogumelar de gentes feias”. Em 1918 foi fundada a Sociedade Eugênica de São Paulo –

SESP, contando com cerca de 140 associados, entre médicos e membros de diversos setores da sociedade que estavam dispostos a “discutir a nacionalidade a partir de questões biológicas e sociais”, tendo em sua diretoria figuras importantes como Arnaldo Vieira de Carvalho, Olegário de Moura, Renato Kehl, T. H. de Alvarenga, Xavier da Silveira, Arhur Neiva, Franco da Rocha e Rubião Meira. A sociedade, suas reuniões e ideias eram amplamente divulgadas e festejadas pela imprensa, e seus membros publicavam em jornais de grande circulação como Jornal do Commercio, Correio Paulistano e O Estado de São Paulo.

Lobato, como um homem de seu tempo, não ficaria imune ao movimento, e em abril de 1918 escreve a Renato Kehl: “Confesso-me envergonhado por só agora travar conhecimento com um espirito tão brilhante quanto o seu, voltado para tão nobres ideais e servido, na expressão do pensamento, por um estilo verdadeiramente “eugênico”, pela clareza, equilíbrio e rigor vernacular. ‘ Era o inicio de uma grande amizade e de uma correspondência ininterrupta até pelo menos 1946, dois anos antes da morte de Monteiro Lobato.

Os eugenistas agiam em várias frentes, como a questão sanitária/higienista, que Lobato rata em Urupês, livro de contos onde nasce o fa 24 sanitária/higienlsta, que Lobato trata em Urupês, livro de contos onde nasce o famoso personagem Jeca Tatu, ou a racial, sobre a qual me aterei tomando como ponto de partida outro trecho de uma das cartas de Monteiro Lobato a Renato Kehl: “Renato, Tú és o pai da eugenia no Brasil e a ti devia eu dedicar meu Choque, grito de guerra pró-eugenia. Vejo que errei não te pondo lá no frontispício, mas perdoai a este estropeado amigo. [… ] Precisamos lançar, vulgarizar estas idéias.

A humanidade pecisa de uma coisa só: póda. É como a vinha. Lobato. O livro mencionado é O Choque das raças ou o Presidente Negro, de 1926, que Lobato escreveu pensando em sua publicação nos Estados Unidos, para onde ele se mudou para ocupar o cargo de adido cultural no consulado brasileiro de Nova York. Em carta ao amigo Godofredo Rangel, Lobato romance americano, isto é, editável nos Estados Unidos(… ). Meio à Wells, com Visão do futuro. O clou será o choque da raça negra com a branca, quando a primeira, cujo índice de proliferação é maior, alcançar a raça branca e batê-la nas urnas, elegendo um presidente negro!

Acontecem coisas tremendas, mas vence or fim a inteligência do branco. Consegue por meio de ralos N. inventados pelo professor Brown, esterilizar os negros sem que estes se dêem pela coisa”. Resumindo bastante, as coisas tremendas são: em 2. 228, três partidos concorrem às eleições presidenciais americanas. O partido dos homens brancos, que pretende reeleger o presidente Kerlog, o partido das mulheres, que concorre com a feminista Evelyn Astor, e Kerlog, o partido das mulheres, que concorre com a feminista Evelyn Astor, e o partido dos negros, representado por Jim Roy.

Com a divisão dos brancos entre homens e mulheres, os negros e tornam maioria e Jim Roy é eleito. Não se conformando com a derrota, homens e mulheres brancos se unem e usam “a inteligência” para eliminar a raça negra, através de uma substância esterilizante colocada em um produto para alisamento de cabelos crespos. A composição dos partidos políticos parece ter sido inspirada por um dos livros preferidos de Lobato, que sempre o recomendava aos amigos, o L’Homme et les Sociétes (1881) de Gustave Le Bon.

Nesse livro, Le Bon diz que os seres humanos foram criados de maneira desigual, condena a miscigenação como fator de egradação racial e afirma que as mulheres, de qualquer raça, são inferiores até mesmo aos homens de raças inferiores. Lobato acreditava que tinha encontrado a fórmula para ficar milionário, como diz em 1926: “Minhas esperanças estão todas na América. Mas o ‘Choque’ só em fins de janeiro estará traduzido para o inglês, de modo que só lá pelo segundo semestre verei dólares. Mas os verei e à beça, já não resta a menor dúvida”.

Com o sucesso do livro, ele esperava também difundir no Brasil a ideia da segregação racial, nos moldes americanos, mas logo teve suas speranças frustradas, como confidência ao amigo Godofredo Rangel: “Meu romance não encontra editor. Acham-no ofensivo à dignidade americana, visto admitir que depois de tanto séculos de progresso moral possa este povo, coletivamente, cometer a sangue frio 4 24 depois de tanto séculos de progresso moral possa este povo, coletivamente, cometer a sangue frio o belo crime que sugeri. Errei vindo cá tão verde.

Devia ter vindo no tempo em que eles linchavam os negros. ” Deve ter sido uma grande decepção para Lobato e seus proJetos grandiosos, visto que, em carta de 1930, ambém a Godofredo Rangel, ele admite fazer uso da literatura para se dizer o que não pode ser dito às claras: “é um processo indireto de fazer eugenia, e os processos indiretos, no Brasil, ‘work’ muito mais eficientemente”. Achei importante contextualizar esse livro porque acredito que todos que estão me lendo são adultos, alfabetizados, com um certo nível cultural e, portanto, público alvo desse romance adulto de Monteiro Lobato.

Sendo assim, peço que me respondam com sinceridade: quantos de vocês teriam sido capazes de, sem qualquer auxílio, sem qualquer contextualização, ealmente entender o que há por trás de O Choque das Raças ou o Presidente Negro? Digo isso porque me lembro que, na época das eleições americanas, estávamos quase todos (sim, eu também, antes de ler o livro) louvando a genialidade do visionário e moderno Monteiro Lobato em prever que os Estados Unidos, um dia, elegeriam um presidente negro, que tinha concorrido primeiro com uma mulher branca e depois com um homem branco.

Mas há também o que está por detrás das palavras, das intenções, e achei importante contextualizá-las, mesmo sendo nós adultos, educados, socialmente privilegiados. O lugar do outro – Peço agora que você faça um exercício: imagine uma criança na sala de aula privilegiados. imagine uma criança na sala de aula das escolas públicas de ensino médio e fundamental no Brasil. Negra. Sei que não deve ser fácil colocar-se sob a pele de uma criança negra, por isso penso em alternativas.

Tente se colocar sob a pele de uma criança judia numa sala de aula na Alemanha dos anos 30 e ouça, por exemplo, comentários preconceituosos em relação aos judeus: ‘ Ou então, ponha-se no lugar de uma criança com necessidades especiais e ouça comentários alusivos ao seu “defeito”: „ Talvez agora você já consiga sentir na pele o que significa ser essa criança negra e perceber a carga histórica dessas palavras sendo arrastada desde séculos passados: “macaca de carvão”, “carne preta” ou “urubu fedorento”, tudo lá, em Caçadas de Pedrinho, onde “negra” também é vocativo.

Sim, sei que “não se fala mais assim”, que “os tempos eram outros”. Mas sim, também sei que as palavras andam cheias de significados, impregnadas das maldades que já cometeram, como lâminas que conservam o corte por estarem sempre ali, arrancando casca sobre casca de uma ferida que nunca acaba de cicatrizar. Fique um pouco de tempo lá, no lugar dessa criança, e tente entender como ela se sente.

Herdeira dessa ferida da qual ela vai ter que aprender a tomar conta e passar adiante, como antes tinham feito seus pais, avós, bisavós e tataravós, de quem ela também herdou os I 6 OF24 feito seus pais, avós, bisavós e tataravós, de quem ela também herdou os lábios grossos, o cabelo crespo, o nariz achatado, a pele escura. Dói há séculos essa ferida: “Em nós, até a cor é um defeito. Um imperdoável mal de nascença, o estigma de um crime. Luiz Gama Volte agora para o seu lugar e se ouça falando coisas do tipo: Eu II Monteiro Lobato na infância e não me tornei racista”, ou “Eu nunca me identifiquei com o que a Emília disse”, ou ‘Eu não acho que chamar alguém de macaco seja racista”, ou “Eu acho que não tem nada de ofensivo”, ou “Eu me recuso a ver Lobato como racista”, ou “Eu acho um absurdo que façam isso com um autor cuja leitura me deu tanto prazer”.

Se você não é parte do problema, nem como negro nem como racista, por que se colocar no centro da discussão? Você também já não é mais criança, e talvez seja a hora de entender que nem todas as verdades giram em torno do seu ponto de vista. Quando criança, talvez você tenha crescido ouvindo ou lendo expressões assim, sempre achando que não ofendiam, que eram de brincadeira e, portanto, agora, ache que não há Importância alguma que continuem sendo ditas em livros dados na escola.

Talvez você pense que nunca tenham te afetado. Mas acredito que, se você continuar não conseguindo se colocar sob a pele de uma criança negra e pelo menos resvalar a dor e a solidão que é enfrentar, todos os dias, o peso dos significados, ouso arriscar que você pode estar enganado. Elas podem ter tirado de você a sensibilidade para e solidarizar com esse grave problema alheio: o racismo. Sim, porque tenho a sensibilidade para se solidarizar com esse grave problema alheio: o racismo.

Sim, porque tenho a sensação de que racismo sempre foi tratado como problema alheio – é o outro quem sofre e é o outro quem dissemina mesmo sua erradicação sendo discutida no mundo inteiro como direitos humanos. Direitos de todos nós. Humanos. Direito de sermos tratados com dignidade e respeito. E é sobre isso que devemos falar. Não sobre você. Esse é um assunto sério, para ser discutido por profissionais que estejam familiarizados com racismo, educação infantil e apacitação de professores, e que inclusive podem contar com o respaldo do Estatuto da Criança e do Adolescente, instituído em 1990 pela Lei 8. 69. Destaco dois artigos do Capitulo II – Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade: Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento esumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. Combate ao racismo no Brasil ‘Só porque eu sou preta elas falam que não tomo banho.

Ficam me xingando de preta cor de carvão. Ela me xingou de preta fedida. Eu contei à professora e ela não fez nada” [Por que não querem brincar com ela]”Porque sou preta. Agente estava brincando de mamãe. A Catarina branca falou: eu não vou ser tia dela (da própria criança que está n brincando de mamãe. A Catarina branca falou: eu não vou ser tia dela (da própria criança que está narrando). A Camila, que é branca, não tem nojo de mim”. A pesquisadora pergunta: “E as outras crianças têm nojo de você? ” Responde a garota: “Têm”.

Depoimento de crianças de 6 anos no livro “Do Silêncio do Lar ao Silêncio Escolar: racismo, discriminação e preconceito na educação infantil”, de Eliane Cavalleiro – Editora Contexto Colocando-se no centro da discussão, como se a “censura” não existente ao livro de Lobato as ofendesse pessoalmente, e como se fosse só isso que importasse nessa discussão, tenho visto várias pessoas fazendo os comentários mais absurdos, inclusive interpretando e manipulando outros textos ficcionais de Lobato ara provar que ele não era racista, ou que era apenas um homem do seu tempo.

Algo muito importante que não devemos nos esquecer é que nós também somos homens e mulheres do nosso tempo, e que a todo momento estamos decidindo o que a História escreverá sobre nós. Tenho visto também levarem a discussão para o cenário politico, no rastro de um processo eleitoral que fez aflorar medos e sentimentos antes restritos ao lugar da vergonha, dizendo que a “censura” à obra de Lobato é mais um ato de um governo autoritário que quer estabelecer a doutrina de pensamento no Brasil, eliminando o livre-pensar interferindo na sagrada relação de leitores com seus livros.

Dizem ainda que, continuando assim, daqui a pouco estaremos proibindo a leitura de Os Sertões, Macunaíma, Grande Sertão: Veredas, O Cortiço, Odisséia, Dom Casmurro leitura de Os Sertões, Macunaíma, Grande Sertão: Veredas, O Cortiço, Odisséia, Dom Casmurro etc, esquecendo-se de que, para fins de comparação, esses livros também teriam que ser distribuídos para o mesmo público, nas mesmas condições. ?s vezes parece-me mais uma estratégia para, mais uma vez, mudar de assunto, tirar o foco do racismo e embolar o meio de campo om outros tabus mais democráticos como o estupro, o incesto, a traição, a violência, a xenofobia, a homofobia ou o aborto. Tabus que, afinal de contas, podem dizer respeitos a todos nós, sejamos brancos ou negros.

Sim, há que se lutar em várias frentes, mas hoje peço que todos apaguem um pouco os holofotes que jogaram sobre si mesmos e suas liberdades cerceadas, concentrem-se nas palavra “racismo” e “criança”, mesmo que possa parecer inaceitável vê-las assim, uma tão pertinho da outra, dêem uma olhada no árduo e necessário processo que nos permite questionar, nos dias de hoje e dentro da lei, se Caçadas e Pedrinho é mesmo um livro indicado para discutir racismo nas salas de aula brasileiras.

Os motivos do parecer – De acordo com a Coordenação Geral de Material Didático do MEC, a avaliação das obras que compõem o Programa Nacional Biblioteca da Escola são feitas por especialistas de acordo com os seguintes critérios: a qualidade textual, a adequação temática, a ausência de preconceitos, estereótipos ou doutrinações, a qualidade gráfica e o potencial de leitura considerando o público-alvo”. A simples aplicação dos critérios já seria suficiente para que o livro Caçadas de Pedrinho deixass 0 DF 24

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