Alfabetização

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HISTÓRIA DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL * Maria Rosário Longo Ai de mim, ai das crianças abandonadas na escuridão. (Graciliano Ramos) Explicações necessárias A fim de contribuir para o debate a respeito do tema deste evento, apresento nesta conferência uma s[ntese de alguns dos resultados de pesquisas que venho desenvolvendo, há mais de duas décadas, a respeito da história do ensino de língua e literatura no Brasil e, em particular, a respeito do ensino da leitura e escrita na fase inicial de escolarização de cria passou a ser denomi OF24 XX.

Em nosso pais, a tóf„: page mais visível na históri os quais, especialm mo esse processo do início do século tem sua face etização, em torno ulo XIX, vêm-se gerando tensas disputas relacionadas com “antigas” e “novas” explicações para um mesmo problema: a dificuldade de nossas crianças em aprender a ler e a escrever, especialmente na escola pública.

Visando a enfrentar esse problema e auxiliar “os novos” a adentrarem no mundo público da cultura letrada, essas disputas em torno dos métodos de alfabetização vêm engendrando uma multiplicidade de tematizações, normatizações e concretizações, caracterizando-se como um importante aspecto dentre os uitos outros envolvidos no complexo movimento histórico de constituição da alfabetização como prática escolar e como objeto de estudo/pesquisa.

Dada tal complexidade e considerando tanto os objetivos deste evento quanto as urgê Swipe to next urgências específicas deste momento histórico, optei por fazer delimitações no tema Conferência proferida durante o Seminário “Alfabetização e letramento em debate”, promovido pelo Departamento de Políticas de Educação Infantil e Ensino Fundamental da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, realizado em

Brasilia, em 27/04/2006. ** Professora Livre-docente – FFC- UNESP-Ma ília; coordenadora do Grupo de Pesquisa “História do Ensino de Língua e Literatura no Brasil”; autora de: Leitura, literatura e escola: sobre a formação do gosto (Martins Fontes); Em sobressaltos: formação de professora (Ed. Unicamp); Os sentidos da alfabetização (São Pau101876/1994) (Ed. Unesp); Educação e letramento (Ed. Unesp). proposto para esta conferência, enfatizando, na história dos métodos de alfabetização: a disputa pela hegemonia de determinados métodos na situação paulista, devido ao caráter odelar que se buscou imprimir às iniciativas educacionais desse estado, a partir dos anos de 1890; e o período compreendido entre as décadas finais do século XIX e os dias atuais, uma vez que, a partir da proclamação da República, iniciou-se processo sistemático de escolarização das práticas de leitura e escrita.

Apesar de todos os riscos envolvidos na opção por abordar um longo período histórico em tão breve exposiçãol e por abordar também um momento histórico ainda presente, mesmo ciente desses riscos, espero, com esta conferência, contribuir para a compreensão de importantes aspectos do passado e do presente a alfabetização em nosso país, e, em decorrência, contribuir, também, para a elaboração de projetos para o futuro, que p 24 país, e, em decorrência, contribuir, também, para a elaboração de projetos para o futuro, que possam auxiliar nossas crianças a realizarem plenamente seu direito de aprender a ler e escrever.

Outro nao é, certamente, o objetivo maior e o “fim último” deste evento e de todos os que dele participam. Escola e alfabetização Em nosso país, desde o final do século XIX, especialmente com a proclamação da República, a educação ganhou destaque como uma das utopias da modernidade.

A escola, por sua vez, consolidou-se como lugar necessariamente institucionalizado para o preparo das novas gerações, com vistas a atender aos ideais do Estado republicano, pautado pela necessidade de instauração de uma nova ordem política e social; e a universalização da escola assumiu importante papel como instrumento de modernização e progresso do Estado- Nação, como principal propulsora do “esclarecimento das massas iletradas”. No âmbito desses ideais republicanos, saber ler e escrever se tornou instrumento privilegiado de aquisição de saber/esclarecimento e imperativo da modernização e esenvolvimento social.

A leitura e a escrita — que até então eram práticas culturais cuja aprendizagem se encontrava restrita a poucos e ocorria por meio de transmissão assistemática de seus rudimentos no âmbito privado do lar, ou de maneira O que será aqui apresentado de forma sintética se encontra detalhado em dois livros de minha autoria: MORTATTI, M. R. Os sentidos da alfabetização: São Paulo – 1876/1994. São Paulo: Ed. UNESP: Brasília: MEC/INEP/COMPED, 2000; e letramento. Paulo: Ed. UNESP, 2004. 3 menos informal, mas ainda precária .

Educação e Educação e letramento. São Paulo: Ed. UNESP, 2004. 3 menos informal, mas ainda precária, nas poucas “escolas” do mpério Caulas régias”) — tornaram-se fundamentos da escola obrigatória, lega e gratuita e objeto de ensino e aprendizagem escolarizados. Caracterizando-se como tecnicamente ensináveis, as práticas de leitura e escrita passaram, assim, a ser submetidas a ensino organizado, sistemático e intencional, demandando, para isso, a preparação de profissionais especializados.

Desse ponto de vista, os processos de ensinar e de aprender a leitura e a escrita na fase inicial de escolarização de crianças se apresentam omo um momento de passagem para um mundo novo — para o Estado e para o cidadão —: o mundo público da cultura letrada, que instaura novas formas de relação dos sujeitos entre si, com a natureza, com a história e com o próprio Estado; um mundo novo que instaura, enfim, novos modos e conteúdos de pensar, sentir, querer e agir.

No entanto, especialmente desde as últimas duas décadas, as evidências que sustentam originariamente essa associação entre escola e alfabetização vêm sendo questionadas, em decorrência das dificuldades de se concretizarem as promessas e os efeitos pretendidos com a ação da escola sobre cidadão. Explicada como problema decorrente, ora do método de ensino, ora do aluno, ora do professor, ora do sistema escolar, ora das condições sociais, ora de pol[ticas públicas, a recorrência dessas dificuldades de a escola dar conta de sua tarefa histórica fundamental não é, porém, exclusiva de nossa época.

Decorridos mais de cem anos desde a implantação, em nosso país, do modelo republicano de escola, 4 24 Decorridos mais de cem anos desde a Implantação, em nosso país, do modelo republicano de escola, podemos observar que, desde essa época, o que hoje denominamos “fracasso scolar na alfabetização” se vem impondo como problema estratégico a demandar soluções urgentes e vem mobilizando administradores públicos, legisladores do ensino, intelectuais de diferentes áreas de conhecimento, educadores e professores.

Desde essa época, observam-se repetidos esforços de mudança, a partir da necessidade de superação daquilo que, em cada momento histórico, considerava-se tradicional nesse ensino e fator responsável pelo seu fracasso. Por quase um século, esses esforços se concentraram, sistemática e oficialmente, na questão dos métodos de ensino da leitura e escrita, e muitas oram as disputas entre os que se consideravam portadores de um novo e revolucionário método de alfabetização e aqueles que continuavam a defender os métodos considerados antigos e tradicionais.

A partir das duas últimas décadas, a questão 4 dos métodos passou a ser considerada tradicional, e os antigos e persistentes problemas da alfabetização vêm sendo pensados e praticados predominantemente, no âmbito das politicas públicas, a partir de outros pontos de vista, em especial a compreensão do processo de aprendizagem da criança alfabetizanda, de acordo com a psicogênese da l[ngua escrita. O que é esse “tradicional”? Quando e por quê se engendra um tipo de ensino de leitura e escrita que hoje é acusado de “tradicional”? O que representava para a(s) época(s) em que ocorre seu engendramento?

Qual sua relação com a tradição que lhe é anterior? Quanto desse “tradicional” engendramento? Qual sua relação com a tradição que lhe é anterior? Quanto desse “tradicional” subsiste nas práticas alfabetizadoras, mesmo nas dos professores que querem superá- las? Como se pode explicar sua insistente permanência? Como dialogam entre si a tradição e os repetidos esforços de mudança m alfabetização? A questão dos métodos de alfabetização A fim de contribuir para a compreensão desse processo e para a busca de respostas às questões formuladas acima, tomemos como exemplo a situação paulista.

Analisando, com base em fontes documentais, o ocorrido nessa província/estado em relação à questão dos métodos de ensino inicial da leitura e escrita, desde as décadas finais do século XIX, optei por dividir esse periodo em quatro momentos cruciais, cada um deles caracterizado pela disputa em torno de certas tematizações, normatizações e concretizações relacionadas com o ensino da eitura e escrita e consideradas novas e melhores, em relação ao que, em cada momento, era considerado antigo e tradicional nesse ensino.

Em decorrência dessas disputas, tem-se, cada um desses momentos, a fundação de uma nova tradição relativa ao ensino inicial da leitura e escrita.

Apresento a seguir cada um desses quatro momentos cruciais com as respectivas disputas pela hegemonia de determinados métodos de alfabetização e, dentre outros múltiplos aspectos neles observáveis, menciono o papel desempenhado pelas cartilhas, que, dada sua condição de instrumento privilegiado de concretização dos métodos conteúdos de ensino, permanecem no tempo e permitem recuperar aspectos importantes dessa história, contribuindo significativamente para a criação de 6 OF24 permitem recuperar aspectos importantes dessa história, contribuindo significativamente para a criação de uma cultura escolar e para a transmissão da(s) tradição (ões). 2 A esse respeito, sugiro a leitura de: MORTATTI, M. R.

Cartilha de alfabetização e cultura escolar: um pacto secular. Cadernos CEDES (Cultura escolar: história, práticas e representações), n. 52, p. 41-54, 2000. 2 5 10 momento- A metodização do ensino da leitura Até o final o Império brasileiro, o ensino carecia de organização, e as poucas escolas existentes eram, na verdade, salas adaptadas, que abrigavam alunos de todas as “séries” e funcionavam em prédios pouco apropriados para esse fim; eram as “aulas régias”, já mencionadas. Em decorrência das precárias condições de funcionamento, nesse tipo de escola o ensino dependia muito mais do empenho de professor e alunos para subsistir.

Eo material de que se dispunha para o ensino da leitura era também precário, embora, na segunda metade do século XIX. houvesse aqui algum material impresso sob a forma de livros ara fins de ensino de leitura, editados ou produzidos na Europa. Habitualmente, porém, iniciava-se o ensino da leitura com as chamadas “cartas de ABC” e depois se liam e se copiavam documentos manuscritos. para o ensino da leitura, utilizavam- se, nessa época, métodos de marcha sintética (da “parte” para o “todo”): da soletração (alfabético), partindo do nome das letras; fônico (partindo dos sons correspondentes às letras); e da silabação (emissão de sons), partindo das sílabas.

Dever-se-ia, assim, iniciar o ensino da leitura com a apresentação das letras e seus nomes (método da soletraçã ensino da leitura com a apresentação das letras e seus nomes (método da soletração/alfabético), ou de seus sons (método fônico), ou das familias silábicas (método da silabação), sempre de acordo com certa ordem crescente de dificuldade. Posteriormente, reunidas as letras ou os sons em sílabas, ou conhecidas as famílias silábicas, ensinava-se a ler palavras formadas com essas letras elou sons elou sílabas e, por fim, ensinavam-se frases isoladas ou agrupadas. Quanto à escrita, esta se restringia à caligrafia e ortografia, e seu ensino, à cópia, ditados e formação de frases, enfatizando-se o desenho correto das letras.

As primeiras cartilhas brasileiras, produzidas no final do século XIX sobretudo por professores fluminenses e paulistas a partir de sua experiência didática, baseavam-se nos métodos de marcha sintética (de soletração, fônico e de silabação) e circularam em várias províncias/estados do país e por muitas décadas. Em 1876, data que elegi como marco inicial do primeiro momento crucial nessa história, foi publicada em Portugal a Cartilha Maternal ou Arte da Leitura, escrita pelo poeta português João de Deus. A partir do início da década de 1880, o “método João de Deus” contido nessa cartilha passou a ser divulgado istemática e programaticamente 6 principalmente nas províncias de São Paulo e do Espírito Santo, por Antonio da Silva Jardim, positivista militante e professor de português da Escola Normal de São Paulo.

Diferentemente dos métodos até então habituais, o “método João de Deus” ou “método da palavração” baseava-se nos princípios da moderna linguística da época e consistia em iniciar o ensino da leitura pela baseava-se nos princípios da moderna linguística da época e consistia em iniciar o ensino da leitura pela palavra, para depois analisá-la a partir dos valores fonéticos das letras. Por essas azões, Silva Jardim considerava esse método como fase científica e definitiva no ensino da leitura e fator de progresso social. Esse 10. momento se estende até o início da década de 1890 e nele tem início um disputa entre os defensores do “método João de Deus” e aqueles que continuavam a defender e utilizar os métodos sintéticos: da soletração, fônico e da silabação.

Com essa disputa, funda-se uma nova tradição: o ensino da leitura envolve necessariamente uma questão de método, ou seja, enfatiza-se o como ensinar metodicamente, relacionado com o que ensinar; o ensino da leitura e escrita é tratado, então, como ma questão de ordem didática subordinada às questões de ordem lingüística (da época). 20 momento — A institucionalização do método analítico A partir de 1890, implementou-se a reforma da instrução pública no estado de São Paulo. Pretendendo servir de modelo para os demais estados, essa reforma se iniciou com a reorganização da Escola Normal de São Paulo e a criação da Escola-Modelo Anexa; em 1896, foi criado o Jardim da Infância nessa escola.

Do ponto de vista didático, a base da reforma estava nos novos métodos de ensino, em especial no então novo e revolucionário método analitico para o ensino da leitura, tilizado na Escola-Modelo Anexa (à Normal), onde os normalistas desenvolviam atividades “práticas” e onde os professores dos grupos escolares (criados em 1893) da capital e do interior do estado deveriam buscar seu modelo escolares (criados em 1893) da capital e do interior do estado deveriam buscar seu modelo de ensino. A partir dessa primeira década republicana, professores formados por essa escola normal passaram a defender programaticamente o método analítico para o ensino da leitura e disseminaram-no para outros estados brasileiros, por meio de “missões de professores” paulistas.

Especialmente mediante a ocupação de cargos na dministração da instrução pública paulista e a produção de instruções normativas, de cartilhas e de artigos em jornais e em revistas pedagógicas, esses professores contribuíram para a 7 institucionalização do método anal[tico, tornando obrigatória sua utilização nas escolas públicas paulistas. Embora a maioria dos professores das escolas primárias reclamasse da lentidão de resultados desse método, a obrigatoriedade de sua utilização no estado de São Paulo perdurou até se fazerem sentir os efeitos da “autonomia didática” proposta na “Reforma Sampaio Dória” (Lei 1750, de 1920).

Diferentemente dos métodos de archa sintética até então utilizados, o método analítico, sob forte influência da pedagogia norte-americana, baseava-se em princípios didáticos derivados de uma nova concepção — de caráter biopsicofisiológico — da criança, cuja forma de apreensão do mundo era entendida como sincrética. A despeito das disputas sobre as diferentes formas de processuaçao do método analítico, o ponto em comum entre seus defensores consistia na necessidade de se adaptar o ensino da leitura a essa nova concepção de criança. De acordo com esse método analitico, o ensino da leitura deveria ser iniciado pelo “todo”, para depois se p 0 DF 24

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