Psicologia
Um breve histórico da psicologia jurídica no Brasil e seus campos de atuação A brief history of forensic psychology in Brazil and its fields of application Vivian de Medeiros LAGOI Paloma AMATOI Patrícia Alves TEIXEIRA 1 Sonia Liane Reichert ROVINSK12 Denise Ruschel BANDEIRAI Resumo Este artigo tem como objetivo discutir alguns referenciais históricos da Psicologia Jurídica no Brasil e, a seguir, apresentar os principais campos de atuação, com uma sucinta descrição das tarefas desempenhadas pelo psicólogo em cada um deles.
Swipe to page Um segundo objetivo teórico para disciplin or 26 para ter um caráter i entre Psicologia e Dir c Direito da Criança e sam Direito do Trabalho. Questões referentes a como referencial pois foi delineado s áreas de interface ito da Família, , Direito Penal e ormaçao acadêmica são levantadas e novas possibilidades de atuação na área da Psicologia Jurídica são apontadas, indicando perspectivas futuras sobre o assunto. Unitermos: Psicologia forense. Histórico. Psicólogos.
Abstract This article aims to discuss some historical references concerning Forensic Psychology in Brazil and to present the main fields of pplication and a brief description of the tasks developed by the psychologist in each one. A second aim is for this material to be used as a theoretical reference for Forensic Psychology subjects, since it was designed with this introductory emphasis. The main areas of interface between Psychology and Law are: Family Law Law, Child and Adolescent Law, Civil Law, Criminal Law and Labor Legislation.
Questions related to education are highlighted and new possibilities for working in Forensic Psychology are noted, with a recommendation of future perspectives on the topic. Uniterms: Forensic Psychology. History. Psychologists. PSICOLOGIA JURÍDICA NO BRASIL Delimitar o início da Psicologia Jur[dica no Brasil é uma tarefa complexa, em razão de não existir um único marco histórico que defina esse momento. Assim, o objetivo deste artigo é apresentar e discutir alguns referenciais históricos documentados que permitam relatar como a Psicologia e o Direito se aproximaram 2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Instituto de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Psicologia. R. Ramiro Barcelos, 2600, sala 120, santana, 90035-003, porto Alegre, RS, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: D. R. Bandeira. E-mail:
Tal inserção deu-se de forma gradual e lenta, muitas vezes de maneira informal, por meio de trabalhos voluntários. Os primeiros trabalhos ocorreram na área cnrmnal, enfocando estudos acerca de adultos cnrmnosos e adolescentes infratores da lei (Rovinski, 2002). O trabalho do psicólogo junto ao sistema penitenciário existe, ainda que não oficialmente, em alguns estados brasileiros há pelo menos 40 anos. Contudo, foi a partir da promulgação da Lei de Execuçao penal (Lei Federal no 7. 10/84) Brasil (1984), que o psicólogo passou a ser reconhecido legalmente pela instituição penitenciária (Fernandes, 1998). Entretanto, a história revela que essa preocupação com a avaliação do criminoso, principalmente quando se trata de um doente mental delinquente, é bem anterior à década de 1 960 do século XX. Durante a Antiguidade a Idade Média a loucura era um fenômeno bastante privado. Ao “louco” era permitido circular com certa liberdade, e os atendimentos médicos restringiam-se a uns poucos abastados.
A partir de meados do século XVII, a loucura passou a ser caracterizada por uma necessidade de exclusão dos doentes mentais. Criaram-se estabelecimentos para Internação em toda a Europa, nos quais eram encerrados indivíduos que ameaçassem a ordem da razão e da moral da sociedade (Rovinski, 1998). A partir do século XVIII, na França, Pinel realizou a revolução institucional, liberando os doentes de suas cadeias e dando assistência médica esses seres segregados da vida em sociedade (Pavon, 1997).
Após esse período, os psicólogos clínicos começaram a colaborar com os psiquiatras nos exames psicológicos legais e em sistemas de just começaram a colaborar com os psiquiatras nos exames psicológicos legais e em sistemas de justiça juvenil (Jesus, 2001). Com o advento da Psicanálise, a abordagem frente ? doença mental passou a valorizar o sujeito de forma mais compreensiva e com um enfoque dinâmico.
Como consequência, o psicodiagnóstico ganhou força, deixanEstudos de Psicologia campinas 1 26(4) 1483-491 1 outubro – dezembro 2009 o de lado um enfoque eminentemente médico para incluir aspectos psicológicos (Cunha, 1993). Os pacientes passaram a ser classificados em duas grandes categorias: de maior ou de menor severidade, ficando o psicodiagnóstico a serviço do último grupo, Inicialmente. Desta forma, os pacientes menos severos eram encaminhados aos psicólogos, para que esses profissionais buscassem uma compreensão mais descritiva de sua personalidade.
Os pacientes de maior severidade, com possibilidade de internação, eram encaminhados aos psiquiatras (Rovinski, 1998). Balu (1984) demonstrou, a artir de estudos comparativos e representativos, que os diagnósticos de Psicologia Forense podiam ser melhores que os dos psiquiatras (Souza, 1998). De acordo com Brito (2005), os psicodiagnósticos eram vistos como instrumentos que forneciam dados matematicamente comprováveis para a orientação dos operadores do Direito.
Inicialmente, a Psicologia era identificada como uma prática voltada para a realização de exames e avaliações, buscando identificações por meio de diagnósticos. Essa época, marcada pela inauguração do uso dos testes psicológicos, fez com que o psicólogo fosse visto como um estólogo, como na verdade o foi na primeira metade do século XX (Gromth-Marnat, 1999). Psicólogos XX (Gromth-Marnat, 1999). Psicólogos da Alemanha e França desenvolveram trabalhos empírico-experimentais sobre o testemunho e sua partlcipação nos processos judicials.
Estudos acerca dos sistemas de interrogatório, os fatos delitivos, a detecção de falsos testemunhos, as amnésias simuladas e os testemunhos de crianças impulsionaram a ascensão da então denominada Psicologia do Testemunho (Garrido, 1994). Atualmente, o psicólogo utiliza estratégias de avaliação psicológica, com objetivos bem definidos, para encontrar espostas para solução de problemas. A testagem pode ser um passo importante do processo, mas constitui apenas um dos recursos de avaliação (Cunha, 2000).
Esse histórico inlcial reforça a aproximação da Psicologia e do Direito através da área criminal e a importância dada à avaliação psicológica. Porém, não era apenas no campo do Direito Penal que existia a demanda pelo trabalho dos psicólogos. Outro campo em ascensão até os dias atuais é a participação do psicólogo nos processos de Direito Civil. No estado de São Paulo, o psicólogo fez sua entrada informal no Tribunal 484 V. M. LAGO et al. de Justiça por meio de trabalhos voluntários com famílias carentes em 1979.
A entrada oficial se deu em 1985, quando ocorreu o primeiro concurso público para admissão de psicólogos dentro de seus quadros (Shine, 1998). Ainda dentro do Direito Civil, destaca-se o Direito da Infância e Juventude, área em que o psicólogo Iniciou sua atuação no então denominado Juizado de Menores. Apesar das particularidades de cada estado brasileiro, a tarefa dos setores de psicologia era, basicamente, a particularidades de cada estado brasileiro, a tarefa dos setores de sicologia era, basicamente, a perícia psicológica nos processos cíveis, de crime e, eventualmente, nos processos de adoção.
Com a implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) Brasil (1990), em 1990, o Juizado de Menores passou a ser denominado Juizado da Infância e Juventude. O trabalho do psicólogo foi ampliado, envolvendo atividades na área pericial, acompanhamentos e aplicação das medidas de proteção ou medidas socioeducativas (Tabajaski, Gaiger & Rodrigues, 1998). Essa expansão do campo de atuação do psicólogo gerou um aumento do número de profissionais em instituições judiciárias ediante a legalização dos cargos pelos concursos públicos.
São exemplos a criação do cargo de psicólogo nos Tribunais de Justiça dos estados de Minas Gerais (1 992), Rio Grande do Sul (1993) e Rio de Janeiro (1998) (Rovinski, 2002). Outro dado histórico importante foi a criação do Núcleo de Atendimento à Família (NAF), em outubro de 1997, implantado no Foro Central de Porto Alegre e pioneiro na justiça brasileira. O trabalho objetiva oferecer a casais e famílias com dificuldades de resolver seus conflitos um espaço terapêutico que os auxilie a assumir o controle sobre uas vidas, colaborando, assim, para a celeridade do Sistema Judiciário (Sllva & polancpyk, 1998).
Vale observar ainda que, com o propósito de acompanhar as mudanças legais e adequar as instituições de atendimento a crianças e adolescentes às diretrizes presentes no ECA, fez-se necessário o reordenamento institucional dessas entidades em todo o pais. A extinta Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (FEBEM) mesclava, e entidades em todo o país. A extinta Fundação Estadual do gem- Estar do Menor (FEBEM) mesclava, em uma mesma instituição, crianças e adolescentes vítimas de violência, maus tratos, egligência, abuso sexual e abandono comjovens autores de atos infracionais (http://www. sjds. rs. gov. br).
Pela Lei 11. 800/02 foram criadas duas fundações: a Fundação de Atendimento Socioeducativo (FASE), responsável pela execução das medidas socioeducativas, e a Fundação de Proteção Especial (FPE), responsável pela execução das medidas de proteção. O surgimento dessas fundações se deu inicialmente no estado do Rio Grande do Sul. Elas são a consolidação do processo de adaptação aos preceitos regidos pelo ECA Iniciado nos anos 1990. Diante do exposto, percebe-se um histórico nicial da aproximação da Psicologia e do Direito atrelado a questões envolvendo crime e também os direitos da criança e do adolescente.
Contudo, nos últimos dez anos a demanda pelo trabalho do psicólogo em áreas como Direito da Família e Direito do Trabalho vem tomando força. Além desses campos, outras possibilidades de participação do psicólogo em questões judiciais vêm surgindo, as quais serão apresentadas e discutidas na segunda parte deste artigo. Em relação à área académica, cabe citar que a Universidade do Estado do Rio de Janeiro foi pioneira em relação à Psicologia Jurídica.
Foi criada, em 1980, uma área de concentração dentro do curso de especialização em Psicologia Clinica, denominada “Psicodiagnóstico para Fins Jurídicos”. Seis anos mais tarde, passou por uma reformulação e tornou-se um curso independente do Departamento de Clínica, fazendo parte do Departamento de Psicologia Social independente do Departamento de Clínica, fazendo parte do Departamento de Psicologia Social (Altoé, 2001). Atualmente, não são todos os cursos de Psicologia que oferecem a disciplina de pslcologia Jurídica. E, quando o fazem, normalmente é uma matéria opcional e com uma carga horária pequena.
Já nos cursos de Direito, ainda que a carga horária também seja reduzida, a disciplina já se tornou de caráter compulsório. Esses dados acarretam uma deficiência na formação acadêmica dos profissionais, o que exige o oferecimento, por parte das instituições judiciárias, de cursos de capacitação, treinamento e reciclagem. Os psicólogos sentem estar sempre “correndo atrás do prejuízo”, uma vez que as discussões sempre giram ao redor de noções básicas com as quais o psicólogo deveria ter tomado contato antes de chegar à instituição (Anaf, 2000).
Porém, essa realidade tem se modificado. Atualmente, são oferecidos cursos de pós-graduação em Psicologia Jurídica em universidades de estados brasileiros como Alagoas, Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais, 485 PSICOLOGIA JURIDICA NO BRASIL Estudos de Psicologia Campinas 1 26(4) 483-491 1 outubro Paraba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo, o que revela a expansão da área no País. Como pode ser evidenciado, o Direito e a Psicologia se aproximaram em razão da preocupação com a conduta humana.
O momento histónco pelo qual a psicologia passou fez com que, inicialmente, essa aproximação se desse por meio da realização de sicodiagnósticos, dos quais as instituições judiciárias passaram a se ocupar. Contudo, outras formas de atuação além da avaliação psicológica ganharam força, ocupar. Contudo, outras formas de atuação além da avaliação psicológica ganharam força, entre elas a implantação de medidas de proteção e socioeducativas e o encaminhamento e acompanhamento de crianças elou adolescentes. Observa- se que a avaliação psicológica ainda é a principal demanda dos operadores do Direito.
Porém, outras atividades de intervenção, como acompanhamento e orientação, são gualmente importantes, como se verá na seção seguinte deste artigo. São áreas de atuação que devem coexistir, uma vez que seus objetivos são distintos, buscando atender a propósitos diferenciados, mas também complementares. Principais campos de atuação Na Psicologia Jurídica há uma predominância das atividades de confecções de laudos, pareceres e relatórios, pressupondo-se que compete à Psicologia uma atividade de cunho avaliativo e de subsidio aos magistrados.
Cabe ressaltar que o psicólogo, ao concluir o processo da avaliação, pode recomendar soluções para os conflitos apresentados, mas jamais eterminar os procedimentos jur[dicos que deverão ser tomados. Ao juiz cabe a decisão judicial; não compete ao psicólogo incumbir-se desta tarefa. É preciso deixar clara esta distinção, reforçando a ideia de que o psicólogo não decide, apenas conclui a partir dos dados levantados medlante a avaliação e pode, assim, sugerir elou indicar possibilidades de solução da questão apresentada pelo litigio judicial.
Contudo, nem sempre o trabalho do psicólogo jurídico está ligado à questão da avaliação e consequente elaboração de documentos, conforme se apresenta a seguir. Os ramos do Direito que frequentemente demandam a participação do psicólogo são: Direito da Família, Dir Direito que frequentemente demandam a participação do psicólogo são: Direito da Família, Direito da Criança e do Adolescente, Direito Civil, Direito Penal e Direito do Trabalho.
Estudos de psicologia Campinas 1 25(4) 483-491 1 outubro – Cabe observar que o Direito de Família e o Direito da Criança e do Adolescente fazem parte do Direito Civil. Porém, como na prática as ações são ajuizadas em varas diferenciadas, optou-se por fazer essa divisão, por ser também didaticamente coerente. Psicólogo jurídico e o direito de família: destaca-se a participação dos psicólogos nos processos de separação e divórcio, disputa de guarda e regulamentação de vistas.
Separação e divórcio: os processos de separação e divórcio que envolvem a participação do psicólogo são na sua maioria litigiosos, ou seja, são processos em que as partes nao conseguiram acordar em relação às questões que um processo desse cunho envolve. Não são muito comuns os casos em que os cônjuges conseguem, de maneira racional, atingir o consenso para a separação. Isso implica esolver o conflito que está ou que ficou nas entrelinhas, nos meandros dos relacionamentos humanos, ou seja, romper com o vinculo afetivo-emocional (Silveira, 2006). ortanto, o psicólogo pode atuar como mediador, nos casos em que os litigantes se disponham a tentar um acordo ou, quando o juiz não considerar viável a mediação, ao psicólogo pode ser solicitada uma avaliação de uma das partes ou do casal. Processos de separação e divórcio englobam partilha de bens, guarda de filhos, estabelecimento de pensão alimentícia e direito à visitação. Desta forma, seja como avaliador ou mediador, o psicólogo busca PAGF