Aprendizagem

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Modelos pedagógicos e modelos epistemológicos FERNANDO BECKER Podemos afirmar que existem três diferentes formas de representar a relação ensino/aprendizagem escolar ou, mais especificamente, a sala de aula. Falaremos, inicialmente, de modelos pedagógicos e, na falta de terminologia mais atualizada, ou adequada, falaremos em pedagogia diretiva, pedagogia não- diretiva e, talvez criando um novo termo, pedagogia relacional. Mostraremos como tais modelos são, por sua vez, sustentados, cada um deles, por determinada epistemologia.

Epistemologia que se mostrou refratária a toda exuberante crítica da sociologia a educação que se agora. A) Pedagogia diretiva final dos anos 70 até to view nut*ge emológico Pensemos no primeiro modelo. Para configurá-lo é só entrar numa sala de aula; é pouco provável que a gente se engane. O que encontramos al? Um professor que observa seus alunos entrarem na sala, aguardando que se sentem, que fiquem quietos e silenciosos. As carteiras estão devidamente enfileiradas e suficientemente afastadas umas das outras para evitar que os alunos troquem conversas.

Se o silêncio e a quietude não se fizerem logo, o professor gritará para um aluno, xingará outra aluna até que a palavra seja monopólio seu. Quando isto acontecer, ele começará a dar a aula. Como é esta aula? O professor fala e o aluno escuta. O professor dita e o aluno copia. O professor decide o que fazer e o aluno executa. O professor ensina e o aluno aprende. Se alguém observasse uma sala de aula na década d de 60 ou de 50, ou, quem sabe, de dois séculos atrás, diria, provavelmente, a mesma coisa: falaria como Paulo Freire, no Pedagogia do Oprimido. Por que o professor age assim?

Muitos dirão, porque aprendeu que é assim que se ensina. para mim, esta resposta é correta, mas não suficiente. Então, por quê mais? Penso que o professor age assim porque ele acredita que o conhecimento pode ser transmitido para o aluno. Ele acredita no mito da transmissão do conhecimento – do conhecimento enquanto forma ou estrutura; não só enquanto conteúdo. O professor acredita, portanto, numa determinada epistemologia. Isto é, numa “explicação” – ou, melhor, crença da gênese e do desenvolvimento do conhecimento, “explicação” da qual ele não tomou consciência e que, nem por isso, é menos eficaz.

Diz um professor (Becker, 1992): O conhecimento “se dá à medida que as coisas vão aparecendo e sendo introduzidas por nós nas rianças… “. Outro professor diz: o conhecimento “é transmitido, sim; através do meio ambiente, família, percepções, tudo”. Outro, ainda: o conhecimento se dá “na medida em que a pessoa é estimulada, ela é perguntada, ela é incitada, ela é questionada, ela é, até, obrigada a dar uma resposta… “. Como se configura esta epistemologia? Falemos, como na linguagem epistemológica, em sujeito e objeto. O sujeito é o elemento conhecedor, o centro do conhecimento.

O objeto é tudo o que o sujeito nao é. -O que é o não-sujeito? -O mundo onde ele está mergulhado: isto é, o meio isico elou social. Segundo a epistemologia que subjaz à prática desse professor, o indivíduo, ao nascer, nada tem em termos de conhecimento: é uma folha de papel PAGF desse professor, o indivíduo, ao nascer, nada tem em termos de conhecimento: é uma folha de papel em branco; é tabula rasa. É assim o sujeito na visão epistemológica desse professor: uma folha em branco. Então, de onde vem o seu conhecmento (conteúdo) e a sua capacidade de conhecer (estrutura)?

Vem do meio físico elou social. Empirismo é o nome desta explicação da gênese e do desenvolvimento do conhecimento. Sobre a “tabula asa”, segundo a qual “‘não há nada no nosso intelecto que não tenha entrado lá através dos nossos sentidos”, diz Popper (1991): “Essa idéia não é simplesmente errada, mas grosseiramente errada… ” (p. 160). Voltemos ao professor na sala de aula O professor considera que seu aluno é tabula rasa não somente quando ele nasceu como ser humano, mas frente a cada novo conteúdo estocado na sua grade curricular, ou nas gavetas de sua disciplina.

A atitude, nós a conhecemos. O afabetizador considera que seu aluno nada sabe em termos de leitura e escrita e que ele tem que ensinar tudo. Mais adiante, frente à aritmética, o professor, novamente, vê seu aluno como alguém que nada sabe sobre somas e subtrações. No segundo grau, numa aula de fisica, o professor vai tratar seu aluno como alguém sem nenhum saber sobre espaço, tempo, relação causal. Já, na universidade, o professor de matemática olha para seus alunos, no primeiro dia de aula e “pensa”: “60% já está reprovado! Isto porque ele os concebe, não apenas como folha em branco na matemática que ele vai ensinar, mas, devido à sua concepção epistemológica, considera-os estruturalmente incapazes de assimilar esse saber. Como se vê, a ação desse professor não é gr PAGF 91 considera-os estruturalmente incapazes de assimilar esse saber. Como se vê, a ação desse professor não é gratuita. Ela é legitimada, ou fundada teoricamente, por uma epistemologia. Segundo esta, o sujeito é totalmente determinado pelo mundo do objeto ou meio físico e social. Quem representa este mundo, na sala de aula, é, por excelência, o professor.

No seu imaginário, ele, e somente ele, pode produzir algum novo conhecimento no aluno. O aluno aprende se, e somente se, professor ensina. O professor acredita no mito da transferência do conhecimento: o que ele sabe, ão importa o nível de abstração ou de formalização, pode ser transferido ou transmitido para o aluno. Tudo o que o aluno tem a fazer é submeter-se à fala do professor: ficar em silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir tantas vezes quantas forem necessárias, escrevendo, lendo, etc, até aderir em sua mente, o que o professor deu.

Epistemologicamente esta relação pode ser assim representada: Como se vê, esta pedagogia, legitimada pela epistemologia empirista, configura o próprio quadro da reprodução da ideologia; reprodução do autoritarismo, da coação, da heteronomia, da ubserviência, do silêncio, da morte da crítica, da criatividade, da curiosidade. Nessa sala de aula, nada de novo acontece: velhas perguntas são respondidas com velhas respostas. A certeza do futuro está na reprodução pura e simples do passado.

A disciplina escolar – que tantas vitimas já produziu – é exercida com todo rigor, sem nenhum sentimento de culpa, pois há uma epistemologia, uma psicologia (da qual não falamos, aqui) e uma pedagogia que a legitimam. O 91 uma psicologia (da qual não falamos, aqui) e uma pedagogia que a legitimam. O aluno, egresso dessa escola, será bem ecebido no mercado de trabalho, pois aprendeu a silenciar, mesmo discordando, perante a autoridade do professor, a não reivindicar coisa alguma, a submeter-se e a fazer um mundo de coisas sem sentido, sem reclamar.

O produto pedagógico acabado dessa escola é alguém que renunciou ao direito de pensar e que, portanto, desistiu de sua cidadania e do seu direito ao exerc[cio da pol[tica no seu mais pleno significado: qualquer projeto que vise a alguma transformação social escapa a seu horizonte, pois ele deixou de acred tar que sua ação seja capaz de qualquer mudança. O cinismo é seu jargão. Traduzindo o modelo pistemológico em modelo pedagóglco, temos a seguinte relação: O professor (P) representante do meio social, determina o aluno (A) que é tabula rasa frente a cada novo conteúdo.

Nesta relação, o ensino e a aprendizagem são polis dicotômicos: o professor jamais aprenderá e o aluno jamais ensinará. Como diz um professor ao responder à pergunta “qual o papel do professor e qual o do aluno? “: “O professor ensina e o aluno aprende; qual é a tua dúvida? “. Ensino e aprendizagem não são pólos complementares. A própria relação é imposslVel_ É o modelo, por excelência, do fixismo, da reprodução, da repetição. Nada de novo pode – ou deve – acontecer aqu . B) Pedagogia não-diretiva e seu pressuposto epistemológico Pensemos no segundo modelo.

Não é fácil detectar sua presença. Ele está mais nas concepções pedagógicas e epistemológicas do que na prática de sala de aula porque esta é difícil de viabil s 1 pedagógicas e epistemológicas do que na prática de sala de aula porque esta é difícil de viabilizar. Pensemos, então, como seria a sala de aula de acordo com esse modelo. O professor é um auxlliar do aluno, um facilitador (Carl Rogers). O aluno já traz um saber que ele precisa, apenas, trazer à consciência, rganizar, ou, ainda, rechear de conteúdo. O professor deve interferir o mínimo possível.

Qualquer ação que o aluno decida fazer é, a priori, boa, instrutiva. É o regime do laissez-faire: “deixa fazer” que ele encontrará o seu caminho. O professor deve “policiar-se” para interferir o mínimo possível. Qualquer semelhança com a liberdade de mercado do neo-liberalismo é mais do que coincidência O professor não-diretivo acredita que o aluno aprende por si mesmo. Ele pode, no máxmo, auxiliar a aprendizagem do aluno, despertando o conhecimento que já existe nele. Ensinar? -Nem pensar! Ensinar prejudica o aluno. Como diz um professor (Becker, 1992): “Ninguém pode transmitir. aluno que aprende. Outro professor afirma: “Tu não transmite o conhecimento. Tu oportuniza, propicia, leva a pessoa a conhecer. Outro, ainda: “… acho que ninguém pode ensinar ninguém; pode tentar transmitir, pode tentar mostrar.. acho que a pessoa aprende praticamente por Que epistemologia sustenta este modelo pedagógico? A epistemologla que fundamenta essa postura pedagógica é a apriorista e pode ser assim representada, a nível de modelo: o “Apriorismo” vem de a priori, isto é, aquilo que é posto antes como condição do que vem depois. O que é posto antes? A bagagem hereditária.

Esta epistemologia acredita que o ser humano nasc depois. -O que é posto antes? -A bagagem hereditária. Esta epistemologia acredita que o ser humano nasce com o conhecimento já programado na sua herança genética. Basta um mínimo de exercício para que se desenvolvam ossos, músculos e nervos e assim a criança passe a postar-se ereta, engatinhar, caminhar, correr, andar de bicicleta… assim também com o conhecimento. Tudo está previsto. suficiente proceder a ações quaisquer para que tudo aconteça em termos de conhecimento. A interferência do meio – físico ou social – deve ser eduzida ao mínimo. ? só pensar no Emilio de Rousseau ou nas crianças de Summerhill (Snyders, 1974). As ações espontâneas farão a criança transitar por fases de desenvolvimento, cronologicamente fixas, que são chamadas de estágios e que são, frequentemente, confundidos com os estágios da Epistemologia Genética piagetiana; nesta, os estágios são, ao contrário, cronologicamente, variáveis. Voltemos ao papel do professor. O professor, imbuído de uma epistemologia apriorista – inconsciente, na maioria das vezes – renuncia àquilo que seria a característica fundamental da ação docente: a intervenção o processo de aprendizagem do aluno.

Ora, o poder que é exercido sem reservas, com legltimidade epistemológica, no modelo anterior, é aqui escamoteado. Ora, a trama de poder, em qualquer ambiente humano, pode ser disfarçada, mas não eliminada. Acontece que, na escola, há limites disciplinares intransponíveis. O que acontece, então, com o pedagogo nãodiretivo? Ou ele arranja uma forma mais “subliminar de exercer o poder ou ele sucumbe. Freqüentemente, o poder, exercido deste modo, assume formas mais PAGF 7 poder ou ele sucumbe. Freqüentemente, o poder, exercido deste modo, assume formas mais perversas que na forma xplícita do modelo anterior.

Assim como no regime da “livre inlciativa” ou de “liberdade de mercado” o estado aumenta seu poder para garantir a continuidade e, até, o aumento dos privilégios da minoria rica utilizando, não a perseguição política, mas a expropriação dos salários e a desmoralização das instituições representativas dos trabalhadores, assim também, por mecanismos indiretos exerce-se, por vezes, numa sala de aula não-diretiva, um poder tão predatório como o da sala de aula diretiva.. Por isso, Celma (1979) afirma que os alunos tinham pavor de sua professora não-diretiva.

Como vimos, ma pedagogia dessa tipo não é gratuita. Ela tem legitimidade teórica: extrai sua fundamentação da epistemologia apriorista. O professor parece, no entanto, não tomar consciência disso. Esta mesma epistemologia, que concebe o ser humano como dotado de um “saber da nascença”, conceberá, também, dependendo das conveniências, um ser humano desprovido da mesma capacidade, “deficitário”. Este “défice, porém, não tem causa externa; sua origem é hereditária -Onde se detecta maior incidência da dificuldades ou retardos de aprendizagem? Entre os miseráveis, os mal-nutridos, os pobres, os marglnalizados… Está, aí, a teoria da carência cultural para garantir a interpretação de que marginalização econômico-social e “déficit” cognitivo são sinônimos. A criança marginalizada, entregue a si mesma, numa sala de aula não-diretiva, produzira, com alta probabilidade, menos, em termos de conhecimento, que uma criança de classe média ou produzirá, com alta probabilidade, menos, em termos de conhecimento, que uma criança de classe média ou alta.

Trata- se, aqui, de acordo com o apriorismo, de “déficit” herdado; epistemologicamente legitimado, portanto. Traduzindo em relação pedagógica o odelo epistemológico apriorista, temos: O aluno (A), pelas suas condições prévias, determina a ação ou inanição – do professor (P). Nesta relação, o pólo do ensino é desautorizado e o da aprendizagem é tornado absoluto. A relação vai perdendo sua fecundidade na exata medida em que se absolutiza um dos pólos. Em outras palavras, a relação torna-se impossível na medida mesma em que pretende avançar.

Ensino e aprendizagem não conseguem fecundar-se mutuamente: a aprendizagem por julgar-se auto-suficiente e o ensino por ser proibido de interferir. O resultado é um processo que caminha nevitavelmente para o fracasso, com prejuízo imposto a ambos os pólos. O professor é despojado de sua função, “sucateado”. O aluno guindado a um status que ele não tem e sua não- aprendizagem explicada como “déficit herdado”; impossível, portanto, de ser superado. C) Pedagogia relacional e seu pressuposto epistemológico O professor e os alunos entram na sala de aula.

O professor traz algum material – algo que, presume, tem significado para os alunos. Propõe que eles explorem este material – cuja natureza depende do destinatário: crianças de pré-escola, de primeiro grau, de segundo grau, universitários, etc. Esgotada a exploração do material, o professor diri e um determinado numero de perguntas, explorando, sis e, diferentes aspectos perguntas, explorando, sistematicamente, diferentes aspectos problemáticos a que o material dá lugar.

Pode solicitar, em seguida, que os alunos representem – desenhando, pintando, escrevendo, fazendo cartunismo, teatralizando, etc. – o que elaboraram. A partir daí, discute-se a direção, a problemática, o material da(s) próxima(s) aula(s). por que o professor age assim? Porque ele acredita – melhor, compreende (teoria) que o aluno só aprenderá alguma coisa, isto é, construirá algum onhecimento novo, se ele agir e problematizar a sua ação.

Em outras palavras, ele sabe que há duas condições necessárias para que algum conhecimento novo seja construído: a) que o aluno aja (assimilação) sobre o material que o professor presume que tenha sigo de cognitivamente interessante, ou melhor, significativo para o aluno; b) que o aluno responda para si mesmo às perturbações (acomodação) provocadas pela assimilação deste material, ou, que o aluno se aproprie, neste segundo momento, não mais do material, mas dos mecanismos íntimos de suas ações sobre este material; ste processo far-se-á por reflexionamento e reflexão (Piaget, 1977), a partir das questões levantadas pelos próprios alunos e das perguntas levantadas pelo professor, e de todos os desdobramentos que daí ocorrerem. O professor não acredita no ensino em seu sentido convencional ou tradicional, pois não acredita que um conhecimento (conteúdo) e uma condição prévia de conhecimento (estrutura) possa transitar, por força do ensino, da cabeça do professor para a cabeça do aluno. Não acredita na tese de que a mente do aluno é tabula rasa, isto é, que o aluno, frente a um conheci

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