Memorial

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João V dirigia os destinos da naçao. Algumas características deste reinado devem ser enumeradas para que melhor se compreendam algumas anifestações políticas, económicas e culturais referenciadas na obra. Assim, o reinado de D. João V constitui uma continuidade da política absolutista que era alimentada pelas enormes remessas de ouro do Brasil, local que depositava toda a atenção do monarca. ? neste reinado que as condições da economia portuguesa melhoram, embora alguns problemas políticos ocorram na vizinha Espanha, concretamente com a Guerra da Sucessão. D. João V tentou manter-se afastado das manobras políticas, adoptando uma postura neutral face aos jogos de poder que se faziam sentir na Europa. Vive-se em Portugal um clima de Iluminismo, movimento filosófico que visou difundir o racionalismo cartesiano e o experimentalismo de Bacon, ilustrado no romance pela construção da passarola.

Mas, para travar estas novas ideologias, a Inquisição reforça, nesta época, o seu poder que estende a todos os sectores da sociedade. Ao Tribunal do Santo Ofício cabia o julgamento de vários tipos de crime, e os autos Swipe to view next page autos-de-fé constituíam a melhor forma de exibir o poder inquisitorial. Vários estrangeirados foram contratados para actuarem nos vários campos artísticos, destacando-se Nicolau Nasoni na rquitectura e Domenico Scarlatti na música.

A nível literário, o destaque vai para o judeu António José da Silva e para o estilo oratório evidenciado no vasto sermonário português, onde a nossa língua atinge um elevado grau de apuramento. Na globalidade, quando os elementos históricos são inseridos na diegese, o autor do Memorial respeita-os. Daí que os aspectos ligados à construção do Convento de Mafra correspondam à realidade. Mas há outros factos históricos aproveitados na obra cujo tratamento sofre alterações ou, então, não existe total correspondência entre estes e a forma como surgem na intriga. o caso de Bartolomeu de Gusmão (que, inicialmente, aparece na obra como Bartolomeu Lourenço), ou as notícias sobre as suas experiências voadoras (que na História são nebulosas, mas que na obra são amplamente desenvolvidas e destacadas). A sua fuga para Espanha e a sua morte têm também alguns ingredientes ficcionais. O relato das práticas da Inquisição, dos acontecimentos populares religiosos (as procissões, por exemplo) e o casamento dos príncipes reais servem para recriar o ambiente de uma época, sobre a qual um narrador, com características próximas do autor, tece inúmeros comentários críticos.

A par destas personagens mais ou menos históricas desfilam outras ficcionais que veiculam a intenção do autor de libertar da lei do esquecimento aqueles que quase sempre são esquecidos, destacando, para isso, alguns nomes que representam metonimi 0 quase sempre são esquecidos, destacando, para isso, alguns nomes que representam metonimicamente os cerca de 20 000 trabalhadores utilizados na construção do convento. Classificação tipológica de Memorial do Convento Relativamente ao romance em análise, o título (Memorial) sugere factos de que reza a História.

Todavia, existem algumas dúvidas quanto à sua classificação. Atendendo à intemporalidade do narrador, que intervém frequentemente na história narrada, parece impossível classificar esta obra como romance histórico. Apesar disto, há na obra a reconstituição de um passado histórico, mas cheio de intromissões e considerações presentificadas. Além disso, a ficção marca aqui a sua presença, bem como a supremacia dada a aspectos que a história não realçou e tudo isto constitui factor de afastamento ao romance histórico.

No fundo, Saramago conta o passado com os olhos postos no presente, evidenciando-se, deste modo, a subjectividade om que a História é narrada. De qualquer modo, existem aproximações ao romance histórico, fundamentalmente na reconstituição de ambientes e de factos respeitantes à História, muito embora esta seja recriada pelo olhar crítico de Saramago que até lhe dá outros heróis, frequentemente aqueles que a verdade histórica esqueceu, colocando-os num plano ficcional.

A preocupação com a realidade social, evidenciada na obra, vai dar, também, ao romance um cariz social, fazendo-se crónica dos costumes da época, destacando-se a gente humilde e oprimida, afirmando-se, deste modo, como romance e intervenção, ao remeter para uma época repressiva, mas ainda experimentada no século XX. Através do passado presentif remeter para uma época repressiva, mas ainda experimentada no século XX. Através do passado presentificado, o romance adquire intemporalidade, visível na repressão, nos desejos e comportamentos das personagens, os quais não se alteraram no momento da escrita.

Mas se uma época da História é evidenciada, os quadros que a reconstituem também caracterizam o ambiente histórico e, neste sentido, a designação de romance de espaço também se enquadra na obra. A reconstituição de cenários que retratam Lisboa e outras localidades permite observar as preocupações com os factos históricos e com o modo de vida dos humildes, por parte de Saramago. Pelo exposto, ressalta a perplexidade na classificação tipológica do romance saramaguiano.

Contudo, parece ser possível estabelecer uma maior aproximação ao romance histórico. Com efeito, «memorial» remete para algo respeitante à memória, para um escrito que relata factos memoráveis, neste caso relacionados com a construção do convento de Mafra. Os eventos narrados ligam-se à verdade histórica dessa onstrução, mas este romance apresenta-se como bastante peculiar. É que à reconstrução da História aliam-se outros aspectos que culminam numa reescrita da História, onde personagens normalmente por ela esquecidas vão ganhar relevo.

O relato histórico que o narrador faz está semeado de comentários e de referências do século XVIII que deverão servir de exemplo para a actualidade. Por isso, a História tem aqui um papel diversificado: aparece como fonte de energia que favorece a história ficcional de Baltasar e Blimunda, mas serve também de assunto quando se relatam momentos istóricos concretos, com 4 OF30 Blimunda, mas serve também de assunto quando se relatam momentos históricos concretos, como a construção do convento ou os casamentos reais.

Realmente, parece ser possível afirmar que Memorial do Convento se aproxima do romance histórico, mas um pouco adulterado, uma vez que História funciona como pretexto para tratar temas e situações conducentes a valores intemporais. Estrutura da obra A análise de Memorial do Convento permite constatar a existência de duas narrativas simultâneas: uma de carácter istórico – a construção do convento de Mafra – e outra ficcionada – a construção da passarola que engloba a história de amor entre Baltasar e Blimunda. A acção principal diz respeito à concretização do plano de D.

João V – a edificação do convento. Mas nesta encaixam-se outras acções, constituindo diferentes linhas de acção que se articulam com a primeira. Linhas de acção presentes na obra: 1 a linha de acção: A do rei D. João V Abrange todas as personagens da família real e relaciona-se com a segunda linha de acção, uma vez que a promessa do ei é que vai possibilitar a construção do convento. Esta linha tem como espaço principal a corte e, depois, o convento, na altura da sua inauguração, no dia de aniversário do rei. a linha de acção: A dos construtores do convento Esta é a linha principal da história, a par da quarta – a que respeita à construção da passarola. Esta segunda linha de acção vai ganhando relevo e une a primeira à terceira: se o convento é obra e promessa do rei, é ao sacrifício dos homens, aqui representados por Baltasar e Blimunda eve. Glorificam-se aqui os homens que se sacrificam, 5 30 passam por d homens, aqui representados por Baltasar e Blimunda, que ela se deve. Glorificam-se aqui os homens que se sacrificam, Baltasar e Blimunda, que ela se deve.

Glorificam-se aqui os homens que se sacrificam, passam por dificuldades, mas que também as vencem. 3a linha de acção: A de Baltasar e Blimunda Nesta linha relata-se uma história de amor e o modo de vida do povo português. As duas personagens (Baltasar e Blimunda) são as construtoras da passarola; a figura masculina é também, depois, construtora do convento, onstituindo-se paradigma da força que faz mover Portugal – a do povo. 4a linha de acção: A de Bartolomeu Lourenço Esta relaciona-se com o sonho e o desejo de construir uma máquina voadora.

Articula-se com a primeira e segunda linhas de acção, porque o padre é o mediador entre a corte e o povo. Também se enquadra na terceira linha, dado que a construção da passarola resulta da força das vontades que Blimunda tem de recolher para que a passarola voe. Pela análise das sequências narrativas da obra, verifica-se a existência de um plano ficcional que se cruza com a História, uma vez que a construção da passarola, evento a que a História se refere, acaba por ser ficcionada quando se afirma que se moverá pela força das «vontades» que Blimunda recolhe.

O narrador e o processo narrativo Tratando-se de uma obra ficcional, esta encontra-se fora do tempo e do espaço. E o anacronismo do discurso do narrador permite-lhe revisitar o passado e recuperar vidas que a História esqueceu. A atitude narratológica assumida no romance coloca dificuldades de classificação, principalmente porque a instância arrativa não é una, subdividindo-se em outras de menor importância, manipuladas pelo narrador principal.

O narrador revela-se quase sempre omni 6 OF30 importância, manipuladas pelo narrador principal. O narrador revela-se quase sempre omnisciente e assume a posição heterodiegética; mas este estatuto não serve as intenções do autor. Por isso este vai servir-se de outros processos ligados à narração, chegando a criar instruções discursivas para os seus comentários, ironias e divagações; empréstimos do estatuto de narrador a outras personagens da história.

A riqueza e versatilidade deste(s) narrador(es) passam pela adopção de estratégias que visam: a) representar-se como narrador-orador capaz de simular um imediatismo no acto de narrar e dando lugar a dialogismos mais ou menos configurados no discurso; b) captar a atenção do narratário – convocado para o discurso, tanto por uma pluralidade ambígua (nós) como por um indefinido (“Veja-se”) – que se pretende participante no acto de contar; c) gerir a informação a contar, relevando a ficção face à história, o plano humano face ao da realeza (a omnisciência mplica, também, selecção e interpretação); d) reflectir sobre o narrado e simular o processo de narração homologicamente ao processo de reflexão escrita; e) solicitar um leitor activo no processo de leitura da obra.

A atitude do narrador principal para com o narrado é aparentemente contraditória: por um lado, temos uma tentativa de aproximação à época retratada, ao reconstituir a cor local e epocal, mas, por outro, dá-se uma enorme distanciação, visível nas inúmeras prolepses e na ironia sarcástica utilizada para atacar alguns aspectos da História, undamentalmente os que se ligam às personagens socialmente favorecidas. O narrador distancia-se do narrado pelas referênc 30 personagens socialmente favorecidas. O narrador distancia-se do narrado pelas referências irónicas, mas também por um processo de afastamento temporal que o obriga a adaptar a linguagem e a distinguir entre um vocabulário respeitante à época histórica retratada e outro que se reporta à actual. A actualização de vocabulário é visível quando descreve a pedra do pórtico da igreja, cujas medidas e peso nos são ados primeiro em pés, palmos e arrobas, para depois falar em metros e quilos.

Temporalmente, mais afastados estão os momentos em que o narrador simula actuais visitas guiadas ao convento de Mafra. Narrador (es) Exemplol «São pensamentos confusos que isto diriam se pudessem ser postos por ordem, aparados de excrescências, nem vale a pena perguntar, Em que estás a pensar, Sete-Sóis, porque ele responderia, julgando dizer a verdade, Em nada, e contudo já pensou tudo isto,» Observando este excerto, verifica-se que o narrador é sem dúvida um narrador não participante – heterodiegético – e mnisciente, que conhece os pensamentos da personagem e que sabe inclusive a resposta que esta lhe daria se a interrogasse num diálogo imaginado.

Exemp102 «Já lá vai pelo mar fora o Padre Bartolomeu Lourenço, e nós que iremos fazer agora, sem a próxima esperança do céu, pois vamos às touradas que é bem bom divertimento» O pronome pessoal primeira pessoa e as formas ver e «vamos» induzem um narrador misturado com a multidão, ou seja, um narrador que também é person dor homodiegético – e que perdendo por instantes a O pronome pessoal primeira pessoa e as formas verbais «iremos» e «vamos» induzem um narrador misturado com a ultidão, ou seja, um narrador que também é personagem – narrador homodiegético – e que perdendo por instantes a faculdade omnisciente, a mais comum em toda a narração, – vai observando objectivamente o ambiente que o cerca, transformando-se num narrador observador. ?A praça está toda rodeada de mastros com bandeirinhas no alto e cobertos de volantes até ao chão que adejam com a brisa e à entrada do curro armou-se um pórtico de madeira, pintada como se fosse de mármore branco» Exemplo 3 «João Elvas só vê cavalos, gente e viaturas, não sabe quem está dentro ou quem vai fora, mas a nós não nos custa nada maginar que ao lado dele se foi sentar um fidalgo caridoso e amigo de bem-fazer, que os há, e como esse fidalgo é daqueles que tudo sabem de corte e cargos, ouçamo-lo com atenção,» Encontramos um narratário irmanado com o narrador no imaginar e no acto de ouvir. Exemplo 4 «El-rei foi a Mafra escolher o sítio onde há-de ser o convento.

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