Pranto de maria pardo

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PRANTO DE MARIA PARDA – GIL VICENTE HUMANISMO Humanismo é o nome que se dá à produção escrita histórica literária do final da Idade Média e inicio da Moderna, ou seja, parte do século XV e início do XVI, mais precisamente, de 1434 a 1 527 . Três atividades mais destacadas compôs esse período: a produção historiográfica de Fernão Lopes, a produção poética dos nobres, por isso dita Poesia Palaciana, e a atividade teatral de Gil Vicente.

E interessante ressa polissêmico, podend mesmo tempo distin desta aula, interessa entendido enquanto or37 anismo é rios enfoques, ao ara os limites strito ou histórico, cultural de uma época marcada por profundas transformações na sociedade europeia. O Humanismo, segunda Escola Literária Medieval, também conhecido como Pré-Renascimento ou Quatrocentismo, corresponde ao período de transição da Idade Média para a Idade Clássica.

Tem como marcos inlciais as nomeações de Fernão Lopes como Guarda-Mor da Torre do Tombo (local onde se guardavam os documentos oficiais), em 1418 e, como Cronista- Mor do Reino, em 1434, quando recebeu de D. Duarte, rei de Portugal, a incumbência de escrever a história dos reis que o recederam.

Historicamente o Humanismo foi um movimento intelectual italiano do final do século XIII que irradiou-se para quase toda a Constantinopla em 1453, muitos intelectuais gregos (professores, religiosos e artistas) refugiaram-se na Itália e começaram a difundir uma nova visão de mundo, mais antropocêntrica, indo de encontro à visão teocêntrica medieval.

Entre as pnncpais idéias humanistas estavam: • retomada da cultura antiga, através do estudo e imitação dos poetas e filósofos greco-latinos; • revalorização da filosofia de Platão, especialmente no que iz respeito à distinção entre o amor espiritual e o carnal – neoplatonismo; GIL VICENTE Gil Vicente (14657 — . 1536? ) é geralmente considerado o primeiro grande dramaturgo português, além de poeta de renome.

Há quem o identifique com o ourives, autor da Custódia de Belém, mestre da balança, e com o mestre de Retórica do rei Dom Manuel. Enquanto homem de teatro, parece ter também desempenhado as tarefas de músico, actor e encenador. É frequentemente considerado, de uma forma geral, o pai do teatro português, ou mesmo do teatro ibérico já que também escreveu m castelhano – partilhando a paternidade da dramaturgia espanhola com Juan del Encina.

A obra vicentina é tida como reflexo da mudança dos tempos e da passagem da Idade Média para o Renascimento, fazendo-se o balanço de uma época onde as hierarquias e a ordem social eram regidas por regras inflexíveis, para uma nova sociedade onde se começa a subverter a ordem instituída, ao questioná-la. Foi, o principal representante da literatura renascentista portuguesa, anterior a Camões, incorporando elementos populares na sua escrita que PAGF 37 anterior a Camões, incorporando elementos populares na ua escrita que influenciou, por sua vez, a cultura popular portuguesa.

PRANTO DE MARIA PARDA O Pranto de Maria Parda é uma das mais célebres peças de Gil Vicente. Intencionalmente, o grande dramaturgo, retratou a realidade das classes pobres de Lisboa, no Século XVI Contrariando os discursos que enalteciam e louvavam a beleza e opulência da capital de um imenso império, Gil Vicente procura desvelar a vivência dos negros e mestiços chegados e nascidos na metrópole que, em Quinhentos, calcula-se que perfaziam 10% da população de Lisboa. Muitos eram alcoólatras, mal-cristianizados, eprimidos pela sub-vida serviçal e sem perspectivas de futuro a que estavam votados.

Vêm-se carnalizados na figura literária de Maria, perspicaz e corrosiva observadora da sociedade, amante do vinho carrascão. podemos imagnar apenas o impacto que o monólogo terá tido na corte e junto do monarca; quando se viu defronte de atrevida mestiça, da base da pirâmide social, para mais mulher, mais a mais sexualmente livre, assumir, entre canadas (litros) de vinho, uma das mais lúcidas e desesperançadas criticas à sociedade dos “fumos da índia”. Gil Vicente foi genial e arrojado, mas quinhentos anos depois já o império se foi, já nada diz.

Na linha de exigência a que acostumou o seu público. para lá da colsificação compulsiva, uma criatura parda; simultaneamente pária, perdida e deambulando com desespero na solidão, procurando uma voz que não responde: – “Não sei que faça… ” – diz. “Quem quer fogo desespero na solidão, procurando uma voz que não responde: “Não sei que faça… ” – diz. “Quem quer fogo, busque lenha! ” – troça de si. Opressão auto-infligida é um retrato e metáfora da fragllidade humana.

Maria Parda, poderosa sedutora cheia de espírito, sorumbática neurastênica, não é fácil de ser interpretada. Por que vio as ruas de Lisboa com tão poucos ramos nas tavernas e o vinho tão caro, e ela não podia viver sem elle Eu só quero prantear Este mal que a muitos toca; Que estou já como minhoca Que puzer¿o a seccar. Triste desaventurada, Que tão alta está a canada Pera mi como as estrellas; 0h! coitadas das guelas! 0h! guelas da coitada! Triste desdentada escura, Quem me trouxe a taes m 7 quem nao cega em ver Nas carnicerias velhas Muitas sardinhas nas grelhas;

Mas o demo ha de beber. E agora que estão erguidas As coitadas doloridas Das pipas limpas da borra, Achegou-lhe a paz com porra De crecerem as medidas. Ó Rua da Ferraria, Onde as portas erão mayas, Como estás cheia de guaias, Com tanta louça vazia! Ja m’a mim aconteceo Na manhan que Deos naceo, Á hora do nacimento, Beber alli hum de cento, s 7 Pera vós ventosidade Naci toda como estou. Fui-me ó Poço do chão, Fui-me á praça dos canos; Carpi-vos, manas e manos, Que a dezaseis o dão. Ó velhas amarguradas, Que antre três sete canadas Sohiamos de beber,

Agora, tristes! remoer Sete raivas apertadas. Ó rua da Mouraria, Quem vos fez matar a sêde pela lei de Mafamede Com a triste diagua fria? Ó bebedores irmãos, E far-vos-hei meu herdeiro. Não tenho filhas nem filhos, Senão canadas e quartilhos; Tenho enxoval de guarda, Se herdardes Maria Parda, Sereis fóra d’empecilhos. João Cavalleiro Amiga, dicen por Villa Un ejemplo de Pelayo, Que una cosa piensa el bayo Y Otra quien lo ensilla. Pagad, si quereis beber; Porque debeis de saber Que quien su yegua mal pea, Aunque nunca mas la vea, ÊI se la quiso perder, PAGF 7 37

Emquanto isto assi dura, Matae com agua a seccura, Ou ide a outrem enganar, Que eu não m’hei de fiar De mula com matadura. (Indo pera casa de Martin Alho, vai dizendo): Amara aqui hei destalar Nesta manta emburilhada: 0h! Maria Parda coitada, Que não tens já que mijar! Eu nao sei que mal foi este, Peor cem vezes que a peste, Que quando era o trão e o tramo, Andava eu de ramo em ramo Não quero deste, mas deste. PAGF 8 7 Mana minha, muito fede. Sete mil custou a pipa; Se quereis fartar a tripa, Pagae, que a vinte se mede. Maria Parda Raivou tanto sideraque E tanta zarzagania,

Vou-me a morrer de sequia Em cima d’hum almadraque. E ante de meu finamento, Ordeno meu testamento Desta maneira seguinte, Na triste era de vinte E dous desde o nacimento. TESTAMENTO trintairos, Cantados per taes vigairos, Que não bebão menos qu’eu. Sejao destes tres d’Almada, E cinco daqui da Sé, Que são filhos de Noé, A que som encommendada. Venha todo o sacerdote A este meu enterramento, Que tiver tão bom alento Como eu tive ca de cote. Os de Abrantes e Punhete, D’Arruda e d’Alcouchete, D’Alhos-Vedros e Barreiro, Me venhão ca sem dlnheiro Até cento e vinte e sete.

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